Tinha quarenta e poucos anos e os cabelos já todos brancos. Magra, de ossos largos e um pouco mais alta que a média das mulheres. Os olhos azuis cinzentos eram cansados demais para sua idade. Guilhermina Gutierrez era uma mulher de costumes severos e exigia de si um pouco menos do que das outras pessoas: a perfeição e o impossível.
Quando jovem, "desencaminhou-se" com um rapaz muito bonito que a prometeu casamento, filhos, e uma casa bem grande num subúrbio carioca. Não teve qualquer uma dessas promessas cumpridas e, após alguns meses de namoro, viu-se sozinha com uma filha para cuidar. A menina foi entregue aos pais de Guilhermina assim que nasceu e foi criada como uma irmã mais nova da própria mãe. Chamava-se Cristina e era linda.
Guilhermina foi para o interior lecionar em um colégio de moças quando Cristina ainda era bem pequena. Torneou-se diretora com o passar do tempo e levava o colégio com a austeridade de um Chefe de Estado, recebendo dos pais das alunas a mais sincera confiança. Não admitia que as meninas tivessem tempo livre e ensinava-lhes francês e piano nos intervalos das aulas regulares. As meninas que não iam para casa nas férias, a diretora inculcava o latim, além de toda a sorte de prendas domésticas. Sua fama de exigente, porém, não lhe fazia justiça, pois também era dedicada e amorosa. Pensava que todas eram suas filhas e as amava com devoção.
Um dia, recebeu o convite de casamento de sua menina, e não poder ocupar o lugar de mãe na cerimônia lhe doía como se ferros incandescentes lhe atravessassem o peito. Chorou durante toda a vida essa dor, mas sufocou-a como tantas outras no porão das lembranças infelizes.
Quinze anos se passaram e ela recebeu a neta como aluna. Esquecia-se de trata-la como sobrinha e a menina achava graça, atribuindo à idade, sem perceber que a senhora não era tão velha assim. Dona Mina, como passou a ser chamada no internato, realmente envelhecera demais para a idade, já não possuía a firmeza no porte que lhe fez parecer mais alta do que na verdade era, confundia o francês com o latim e não dava conta de vigiar as fugas das moças nas noites de festa na cidade. A vida monástica e a impossibilidade de expressar à filha todo o amor que havia para ela em seu coração acrescentaram dez anos a cada uma que vivia, e sentia-se como uma anciã pré-diluviana. A única coisa que a fazia remoçar era quando escovava os cabelos da neta e contava-lhe as aventuras da infância, passada numa pequena cidade, a sétima de doze irmãos. Relembrava as estripulias de menina e inventava finais diferentes para cada uma das histórias. E era como se as tivesse vivido assim.
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